No meu último texto eu tava meio deprê. No olho do furacão, do tsunami, da avalanche, sei lá… eu usei várias analogias. Eu disse que passa e passa. E pra mim, normalmente, passa rápido por dois* motivos principais: o primeiro definitivamente é o meu medo de sofrer. Eu odeio. E sim, todo mundo odeia, mas eu tenho quase que um pânico dessa situação. Só de pensar que eu vou sofrer, eventualmente, eu já to no fundo do poço procurando como sair de lá o mais rápido possível. Eu viro um trator desses que simplesmente passa por cima de tudo. E esse tudo, são os meus sentimentos. Já falei sobre isso algumas vezes. Nem sempre é saudável, às vezes é preciso sentir e estou tentando entender como fazer isso pra dar uma folga pro meu corpo.
Eu vejo uma galera que valoriza o sofrimento, uns até que acham o esgotamento glamuroso (galerinha de agência que ta lendo vai conseguir lembrar, de cara, de uns 5 ou 6 que fazem isso). Ou busca ele pra tirar alguma coisa da situação, de forma consciente ou por acaso. Eu não. Eu odeio me sentir mal. Eu sinto que eu estou desconectada de mim. Sinto que eu estou ocupando um lugar que não é meu. A ideia de sofrer me causa mais sofrimento que o próprio sofrimento. É. Isso deve ter um nome. Agorafobia? Não vou nem dar google que eu já começo somatizar. Falei sobre isso com a psiquiatra na semana passada e ela disse eu me anestesio ficando bem rápido pra não encarar meu sofrimento. Um trabalho em progressso, me aguardem sofredora que vem aí, hein. Enfim…
O segundo motivo que faz passar rápido é porque eu sou mimada. Sim, ainda bem.
Isso é meio inevitável: a única filha, a única neta e a única sobrinha. Só posso ser a favorita, concordam? Pra vocês terem uma ideia, eu entrava de carruagem nos meus aniversários na hora do parabéns. UM PÔNEI VINHA PUXANDO UMA CHARRETE COM A PRINCESINHA LÁ DENTRO. Sentiu a força disso? Os anos 90 foram um grande evento na minha família, definitivamente. E se você está se perguntando se eu gosto, a minha resposta é padrão: é bom e ruim pelo mesmo motivo - é tudo pra mim. Tem uma parte boa, muito boa, mas também um peso grande, uma responsabilidade.
Nos últimos dias, o mundo virou do avesso e ser a única me deu medo. Medo de não ter ninguém pra contar, pra me apoiar, medo de ficar sozinha no mundo. Quase que uma inveja de famílias grandes que dividem e se apoiam. Faz parte da dinâmica de fazer parte daquilo, dividindo laços sanguíneos ou não, sobrenome, história, origem… Poder jogar no grupo de familia e ter respostas diferentes, soluções, ajuda, torcida, apoio. É, deve ser legal… né? Pelo menos na teoria.
Qualquer meia hora que você conversa com alguém vai ouvir aquela história de um pai mau caráter, uma tia golpista, um cunhado duvidoso, um primo inconveniente. O que me leva a superar essa inveja - já que esses laços não garantem nada. Toda família tem. É a briga pelo terreno na praia, por 200 reais que estão escondidos embaixo do colchão, por aquele pirex... Estar cercado de gente não garante que você não vai se sentir sozinho no mundo. É aquele clichê de estar numa sala cheia e mesmo assim se sentir solitário. Nesse ponto, eu tenho é sorte, pensando bem. Menos gente pra me mostrar que o ser humano pode ser decepcionante.
Tem aquela frase famosa do Senna que fala que todo mundo vai te decepcionar um dia, você precisa escolher por quem vale a pena sofrer e se uma escolha que eu fiz acertada nessa vida foi de manter comigo os amigos que eu tenho. Um destino generoso demais que colocou no meu caminho tanta, MAS TANTA, gente incrível.
Continuando com os clichês, eu confirmo que os amigos são a família que a gente escolhe. Uma família que quer estar junto, se escolhe todos os dias e renova os laços, sem obrigação nenhuma. E aí, fazendo essa análise, eu vejo que eu sou mimada mesmo. E privilegiada também por ter tanta gente cuidando de mim quando eu preciso.
Eu posso estar a três quarteirões ou a um voo de mais de 12h que eu sei que, na verdade, eu estou a uma mensagem de distância. Tem noção do quanto isso é lindo? Eu sei que se eu mandar um ‘não to bem’, ou se eu responder de um jeito um pouquinho diferente, vai ter alguém pra me dar colo. Das várias linguagens de amor, uma das minhas favoritas é estar ali.
E estar ali pode ser tanta coisa. Pode ser só compartilhar o silêncio junto, me deixar chorar, me deixar reclamar, me dar um conselho não solicitado com todo o cuidado do mundo pra respeitar os limites que cada momento pede. Pra amar e pra brigar é preciso conhecer o outro, eu sempre achei isso. Depois que você fala, não volta. Não importa se você pede desculpas um milhão de vezes. E essa também é uma linguagem de amor: o cuidado.
Eu tento ser essa pessoa. E acho que a cada ano que passa eu melhoro nesse papel. Menos dedo na cara, mais peito aberto. Ouvir, acolher, abraçar e ajudar a seguir em frente. E quanto mais eu falo, mais eu aprendo. Meus amigos me ensinam todos os dias. Cada um do seu jeito. Eu aprendo até o que eu não quero aprender. E aprendo que tudo bem sofrer já que não sofro sozinha.
Durante muito tempo eu fui um pouco inacessível. Deixei pouquíssimas pessoas conhecerem minhas fraquezas. Não valia a pena. Hoje, sou um livrão aberto pra quem eu confio e percebo que meus amigos me levam pra frente. Definitivamente não estou sozinha no mundo. E aprendi também que eu tenho um amigo pra tudo e entender isso é reconhecer os limites de cada um, não usar as pessoas ao meu favor. Pra beber, pra chorar junto, pra cozinhar, pra viajar, pra ir na Leroy Merlin, pra ouvir 700 vezes a mesma história, pra me ajudar a resolver problemas complexos ou pequenos dramas do cotidiano, pra perdoar os meus atrasos, pra me ler o mapa astral de um boy, pra ir me buscar num ponto de adoção de cachorro… Obrigada.
O furacão ta se afastando lentamente e, por causa dos meus amigos, eu consigo passar por ele com mais leveza e perspectiva. Vai ficar tudo bem. Isso também passa.
Esse texto é uma grande carta de amor pra todas as pessoas que me mimam, acolhem e me fortalecem, ou que fazem com que eu não me esqueça da minha força. E um lembrete que eu to por aqui também.
Seja essa pessoa, se cerque de pessoas assim. Já diria o Chorão e o meu nick no MSN em 2008: “Cuide de quem corre do teu lado e quem te quer bem, essa é a coisa mais pura”.
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*AtualizaCÃO (desculpa o trocadilho): falei lá em cima que eram dois motivos principais, mas deixei um *, vocês notaram? Pois é, agora eu tenho mais dois motivos pra levantar. Dois motivos que me enchem de amor, incondicional, e deixam a vida mais leve.
Apresento à comunidade papinher Bentinha e Adelaide (banguelinha, por isso a língua pra fora) :)
Já são cachorras adultas que viviam na casa de uma acumuladora de animais, que tinha mais de 70 cachorros. No começo eu fiquei insegura de pegar um cachorro já crescido, mas quando vi essas carinhas fiz o cartão torar na Cobasi. Perdão aos gatos que ficaram em outra história.
Seus textos sempre um conforto. Estou aqui sempre para você amiga.