Quem nunca mexeu no cabelo porque todo o resto estava desmoronando que atire a primeira pedra. Não to nem falando das franjas que a pandemia trouxe e encheram os feeds do instagram, mas de uma vida inteira resumida em “ai eu to tristinha, deixa eu ver se loira eu fico mais contente”. Spoiler: não ficava.
E não sei vocês, mas se eu to me sentindo bonita, parece que fica mais fácil encarar a vida. E às vezes é só uma ilusão de achar que eu to bonita demais pra sofrer e sigo em frente, mas quando eu to só o chorume, a mosca do cocô do cavalo do bandido, tudo ganha um peso muito diferente. Parece fútil, mas é real. Estar (e se sentir) bonita é quase um super poder.
De uns tempos pra cá eu parei de mexer no cabelo. Agora eu me tatuo. É, foi isso mesmo que você leu. O surto veio e de novembro até agora eu fiz seis tatuagens. Um amigo já diria, ‘a Julia virou tatuadora em série’. E eu to um perigo, não posso ver um nada que já penso se daria uma tattoo nova. A real, é que resolvi fazer (quase) tudo que tenho vontade.
E aqui tenho falado bastante sobre perceber a passagem do tempo e ter consciência do amadurecimento. A verdade é que eu acho que eu sou exatamente a mesma Julia (um pouco mais fora da bolha) de sempre. Há quem diga que eu to saindo do meu casulo, inclusive um beijão aqui pra minha psicóloga e pra minha terapeuta floral, mas no fundo no fundo, eu acho que to só mostrando quem eu sempre fui.
E aí eu trago pra vocês a grande questão que está na minha cabecinha de mulher madura de quase 30 anos (to reforçando isso pra ver se eu acredito): a gente se reinventa ou só se permite ser quem realmente é? Eu acho que um pouco dos dois, porque como diria meu avô, “ninguém muda a pinta da onça”. Talvez o amadurecimento seja só uma evolução da nossa essência. Hm. Bonito isso, gostei.
Fiquei pensando muito sobre o que define a nossa essência. As experiências que fazem a gente ser quem é. E eu tenho medo de ser rasa. Muito medo. Todas as vezes que releio o que eu escrevi, tenho medo de não chegar a lugar nenhum ou entrar numa posição arrogante, de ficar parecendo que estou descobrindo a roda e to só falando obviedades. Ou pior, que não to fazendo nada mais que a minha obrigação, sabe? E isso começa a extrapolar o que eu tenho feito pro Papinhos e entra numa questão existencial também. Será que eu sou rasa na vida? Será que eu preciso me reinventar?
Há uns dias eu assisti o especial da Oprah com a Viola Davis na Netflix e uma coisa que elas falaram ali me chamou atenção: “a vida é a morte do eu”. E pra você, talvez isso bata diferente, mas pra mim, foi pra completar essa reflexão da gente se reinventar. É preciso deixar pra trás quem a gente já foi? A gente vai matando um pedacinho de cada vez que não faz mais parte da gente pra deixar uma nova versão existir?
Minha infância foi cercada por medo. Trauma atrás de trauma atrás de trauma. Uns maiores, outros menores - mas um se sobrepondo ao outro e aumentando a força do anterior, aprendi na terapia que isso acontece. Foram várias situações de violência que eu não vou listar pra não ficar um texto bad vibes, mas o soco no estômago, aquela sensação de ‘isso ta muito errado’, sempre foi um grande fantasma que me acompanhava. Meus pais sempre tentaram me colocar pra frente e me dar segurança pra seguir, não foi por falta de apoio. Mas demorou. Foi mesmo uma construção e eu finalmente consegui deixar isso no passado ou, minimamente, em segundo plano.
No final do ano, no meio da madrugada, eu ouvi um estrondo. Vidro quebrando pra todo lado. Acordei, pulei da cama e pensei “minha mãe tropicou no chinelo nuvem dela e se arrebentou na porta da cozinha”. Encontrei meu pai desorientado no corredor também tentando entender o que tinha acontecido. Pra vocês terem ideia, eu já fui assaltada três vezes. Arma na cabeça, a refém principal, a grande protagonista - alguns dos traumas da infância. Pra quem viveu isso, achar que minha mãe tinha se arrebentado foi uma grande vitória. DESCULPA, MÃE. Ah, foi o box que basicamente explodiu sozinho - naquela época eu ainda não era uma adepta da limpeza espiritual.
Nesse caso, a minha mudança foi de perspectiva. Me reinventei pra encarar a vida de um jeito mais leve. Não precisei descolorir o cabelo pra isso - embora já tenha feito algumas vezes. Ainda sou um suricato. Atenta, alerta, mas isso não é mais um impeditivo pra eu ser todo o resto.
Falando com uma amiga, constatei que to numa fase boa. E sei que, como tudo, passa. Então vou aproveitar a onda boa pra dividir isso aqui. To confortável de ser quem eu sou. A versão melhorada e atualizada de quem eu sempre fui. Ainda o suricato, mas que escolhe as tretas. Ainda tagarela, mas que escolhe melhor as palavras e que aprendeu a ouvir pra mudar de ideia sempre que se equivoca. Ainda um pouco com síndrome de dona da verdade, mas que aprendeu a fazer autocrítica. E volta o medo de ser rasa. Se vocês tiverem achando isso, mil perdões.
É, se reinventar é uma conversa complexa. E pra fechar, vou trazer mais uma reflexão que ferve no meu cabeção: o papel das redes sociais nesse processo. O algoritmo força a gente a se reinventar de certa forma. Uma roupinha nova, um corte de cabelo, um rolê que a sua bolha ta frequentando… eu vejo o quanto eu mudei, e até abri minha cabeça nos últimos anos. E é inevitável: vendo o que as pessoas tão compartilhando fica claro que cada um caiu pra um lado do muro e a panelinha hoje é totalmente coordenada pelo Mark Zuckerberg. Será que essa minha vontade repentina de cortar a franja veio dele também? Sai fora relâmpago markinhos.
Bom, enquanto tamo só mexendo no cabelo, ta bom. O problema é mexer na democracia, né? Mas esse é um oooutro papo.
Ih, militei.
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E aí? Ta buscando a sua ~melhor versão~ também? kkkk Compartilha com alguém que também vai curtir esse papinho!