Quando você tem uma lista interminável de coisas pra fazer, minha sugestão é que você comece pela mais fácil. Da uma sensação de que a vida andou, que tudo é possível, que você é invencível e que nada pode te parar.
Ih, hoje eu to atacada.
É questão de perspectiva. É como a gente pode fazer a vida ser mais leve, já que ela não para e nem espera você se recompor. As tarefas se acumulam - assim como a louça na pia -, as contas não param de chegar, as pessoas tão vivendo movidas pelos próprios interesses e se alguém vai olhar pra você, vai ter que ser você mesmo. Então, se liga! Se cuida!
Meu pai andava de skate quando era adolescente. Depois, de moto. Se pegar uma foto dele da época, não dá pra saber se é anos 70/80 ou qualquer bar da Santa Cecília no último fim de semana. Hipster antes de ser cool. Aquele jovem aventureiro, que, por isso, não tem medo de cair e se machucar? Então… E é uma coisa que eu não consigo entender. Como você sobe num negócio que VAI te derrubar? A sensação boa da adrenalina não supera meu medo de me ralar toda.
Quando eu era criança, ele me contava uma história que tinha sofrido um acidente e quebrado a cabeça. No lugar, colocaram uma placa de metal. Ele pegava um ímã de geladeira, desses moles de pizzaria, e apoiava na testa: “viu? gruda!'“. E eu? Acreditava. Julia com 4,5,6,10 e mais recentemente, com uns 25 anos, ainda acreditava nisso. Até que, contando essa história, eu entendi o absurdo. Eu entendi o exagero. CLARO QUE É MENTIRA!!! Fui falar com ele, ele riu. É dessas mentirinhas inocentes que você conta pra entreter uma criança e que, como adulto, você toma como verdade sem contestar. Aí eu entendi.
Entendi que eu vi o que ele me mostrou e o que eu escolhi acreditar. Que confiar, quando criança, não era uma escolha consciente. Mas seguir acreditando na história, foi só por falta de questionamento.
Por outro lado, lembro em um aniversário meu, de uns 11 anos, de ter ficado muito brava com a minha mãe porque ela não parava de atender o telefone ao longo do dia. Ela tinha se ausentado do trabalho pra ficar comigo, mas daquele jeito. Sempre respondendo alguém que precisava muito dela. Na época, era falta de amor por mim. Hoje eu entendo. A perspectiva muda e tenho vontade de pedir desculpa pra ela por todas as vezes que fui injusta e duvidei desse amor. Nunca foi falta de amor.
Hoje eu entendo.
Nem sempre o que ta ali, é. Quantas vezes você enxergou uma situação nas lentes que te convinham? Ou quantas vezes alguém te induziu a enxergar aquilo? Uma vez, um terapeuta me disse ‘ninguém tenta colocar um paletó numa parede sem que tenha ao menos uma sombra que se pareça com um gancho’. Um pouco confuso e nem sei se concordo completamente. Às vezes tiveram sinais, sim. Mas às vezes, você também ignorou todos eles por conveniência. Ou viu outros. Quem é que sabe?
Aí é preciso olhar pra dentro. Voltar pra si. Brega e real. O que é que você quer ver? O que é que você ta disposto a enxergar? Sai fora com o papo de ver o lado bom. Às vezes eu quero só a verdade. Não quero saber se eu vou aprender alguma coisa, se é isso que vai me tornar mais forte, se é isso que vai fazer eu ser a mulher que sou hoje. Eu só quero resolver. É pedir demais?
Quero saber se é puxada de tapete, se é pra quebrar a cara, se é pra partir o coração. Quero saber se vale a fila de espera, se vale a viagem longa, se vai chegar frio aqui em casa. Eu quero saber. Mas se a sua verdade pode ser diferente da minha, dá pra saber?
É preciso viver tudo, por mais insuportável que isso pareça. Ao mesmo tempo que eu não quero aprender o tempo todo, eu sou gentil comigo lembrando que ‘sempre fiz o que podia com as ferramentas que tinha na época’. É um mantra bom, da pra usar em várias esferas da vida. Alivia um pouco a insegurança, a incerteza e dá um impulso pra tentar fazer diferente. Arriscar mais. Mas não da pra se amar o tempo inteiro, ninguém aguenta. Às vezes é melhor enxergar só o que convém ou só o que você ta pronto pra tirar da frente.
Eu, com 11 anos não ía nunca entender como era importante atender o telefone pra resolver um BO que podia virar um problemão no trabalho. Hoje, com 30, entendo. Resolver agora pra não virar nada maior do que precisa. É… parece bom.
Preciso superar um assunto, deixar pra lá uma mágoa. Preciso lidar melhor com a situação que tira meu sono. Preciso guardar dinheiro. Preciso trocar o interfone. Preciso replantar o pacová num vaso maior. Preciso levar o lixo lá embaixo. Preciso aceitar que meu pai nunca quebrou a cabeça e preciso pedir desculpa pra minha mãe.
Preciso também comprar ração. A vida não para. E isso é fácil de resolver.
Vou na Cobasi. Aproveito pra descer com o lixo. Já volto.
Volto pra mim.
***
Manda pra quem ta pirando porque não consegue colocar em perspectiva. Se cuida!
***
Maravilhosa como sempre